Devo adiar o meu Enem? Sim ou não? Por que?
- Andréa Santos

- 10 de jun. de 2020
- 5 min de leitura

Há algumas semanas atrás, todos pudemos acompanhar a polêmica envolvendo o Enem 2020.
Em virtude da pandemia que acometeu o mundo e a cerca de 03 meses chegou ao Brasil, fomos todos obrigados a manter o distanciamento social. Com isso, as aulas presenciais nas escolas públicas e privadas foram suspensas, essas deram lugar, do dia para a noite, ao ensino remoto, aulas EAD, vídeo aulas, aulas online, enfim, toda a sorte de recursos com o objetivo de manter os alunos minimamente em contato com alguma rotina escolar.
Estivessem as escolas, professores e alunos preparados ou não, todos tiveram que se adaptar de alguma forma. Há 03 meses, assistimos uma corrida por parte das escolas e secretarias de educação no sentido de adotar um modelo que melhor se adaptasse a cada realidade. O que constatamos, foi que ninguém ou quase nenhuma instituição escolar estavam preparadas para isso. Outra triste constatação, foi o escancaramento das diferenças sociais que sempre assolaram nosso país, e que se fizeram ainda mais evidentes na educação nesse momento. E foi exatamente isso, que motivou toda a discussão sobre o adiamento do Enem, que foi finalmente postergado, após muita pressão da sociedade civil.
No entanto, eu proponho algumas outras reflexões sobre o tema.
É inegável que o fato de termos muitos alunos pelo país vivendo em condições desiguais e muito precárias, especialmente no que diz respeito ao acesso à essa educação a distância, por si só, já justifica o adiamento do Enem para todos os alunos. Porém, individualmente cada jovem, dentro de sua família, cada um com sua realidade, tem uma reflexão a ser feita e uma decisão a ser tomada: Devo adiar o meu Enem, sim ou não? Por quê?
Será esse um bom momento para fazer a prova?
Tenho certeza de que qual o curso escolher?
Me sinto preparado para escolher?
Como tem sido a adaptação ao modelo de ensino virtual?
Como estão as emoções do jovem neste momento que estamos vivendo?
O que as adversidades do momento (pandemia, crise econômica e política) trouxeram para esta família?
Essas e muitas outras perguntas, podem ser feitas pelo jovem a si mesmo, bem como compartilhadas com a família para apoiar uma reflexão sobre melhor momento para prestar o Enem.
A despeito da decisão do governo em adiar a aplicação da prova, o jovem e sua família também podem, em função de vários aspectos que vão desde não se sentir preparado, ainda não ter certeza sobre qual profissão escolher, até estar emocionalmente ou psicologicamente sensível com toda a realidade que tem nos cercado, “adiar” a sua prova.
Muitos concordam que fazer a escolha profissional aos 17 anos é um desafio bem grande para a maioria. Nos falta maturidade, conhecimento e experiência para tal decisão. O que gera ansiedade, insegurança, medo.
Em condições “normais” o meio é um grande apoio para o jovem nesse momento. Compartilhar com amigos, professores e orientadores na escola suas angústias e inseguranças, se ver no mesmo “barco” que muitos de seus colegas e perceber que não é o único a ter dúvidas, ajuda a dividir e amenizar esse sofrimento.
Obter informações sobre as profissões através de professores, das feiras de profissões das escolas e universidades são de grande ajuda para escolher qual curso fazer. Tudo isso na atual realidade, está suspenso ou acontecendo de uma forma completamente diferente e não na mesma frequência. Assim sendo, neste momento específico e ímpar que estamos vivendo, este é mais um fator que pode prejudicar a escolha profissional dos jovens.
Um outro ponto de fundamental importância é o que está acontecendo dentro de cada família nesse momento.
Sabemos que entre os mais vulneráveis, a sobrevivência é a prioridade. Muitas famílias estão tendo suas necessidades básicas minimamente atendidas, através da solidariedade de outros. Todo o recurso que se tem nesse momento para gerar alguma renda está sendo usado, inclusive os jovens, que se não estão realizando alguma atividade remunerada para trazer dinheiro para casa, estão cuidando dos irmãos, primos, vizinhos mais novos para que os adultos possam trabalhar, uma vez que creches e escolas estão fechadas. Sem falar na falta de acesso a uma infraestrutura de internet, hardware e local adequado para estudar.
Na classe média, onde estão a maioria de pequenos e médios empreendedores, profissionais liberais e autônomos, os desafios também são enormes. Em sua maioria, viram sua fonte de renda ter que fechar as portas do dia para a noite, tendo que pensar em como manter seus negócios, empregados, pagar suas contas e manter a família. Tudo isso impacta a disposição emocional e psíquica dos pais para apoiar os jovens nesse momento. Muitos jovens estão convivendo 24h por dia com pais estressados, preocupados e quem sabe até em desequilíbrio emocional. E, claro que financeiramente, estão também sentindo o impacto da crise. Muitos são os pais que passaram a não ter condições te pagar a mensalidade escolar e já consideram a possibilidade de tirar os filhos da escola.
Longe de colocar aqui uma visão de que todos estão vivendo esse momento da mesma forma, concordo com a máxima que está circulando por aí de que: “Estamos todos no mesmo mar, mas não no mesmo barco.” No entanto, dentro de suas realidades, há pessoas em sofrimento.
Por isso, pensar em adiar a “sua” prova e substituir a escola no próximo ano por um cursinho pré-vestibular bem feito, iniciar no primeiro emprego, engajar-se em um trabalho voluntário, ajudar a família ou amigos nos negócios próprios, são boas opções para se ganhar um tempo maior de preparação, reflexão, pesquisa sobre profissões e principalmente, maturidade para a escolha profissional.
Não, isso não é perder tempo. É ganhar tempo, maturidade e autoconhecimento.
É sabido que, nos dias atuais, escolher e iniciar um curso universitário aos 17, 18 ou 19 anos vai fazer nenhuma diferença na trajetória pessoal ou profissional de alguém. Na verdade, adiar esse momento com consciência e planejamento, vai fazer com que o futuro profissional ganhe:
Autoconhecimento: mergulhar profundamente em si mesmo buscando identificar habilidades, interesses, competências desenvolvidas e a desenvolver e características pessoais, que o jovem possa desconhecer.
Tempo e aprendizado para escolher: entendendo e vivenciando que escolher envolve renunciar, avaliar cenários, testar e então optar pelo caminho que lhe parece o melhor.
Aprender a lidar com a ansiedade: muitas vezes parar, esperar, observar e dar um passo atrás, rever a “rota”, pode ser a chave para caminhar com mais segurança e clareza lá na frente.
Pode ser um tempo necessário também para que a família ganhe estrutura e organização para apoiar o jovem na sua escolha ou quem sabe no seu sonho.
Adiar também não é uma decisão fácil, é também fazer uma escolha, é também renunciar ao início imediato, mas também é uma opção e como tal pode ser considerada.
Adiar, não quer dizer abrir mão, deixar para lá, mas iniciar em um outro momento, mais preparado, maduro, com objetivo, planejamento e determinação.
Tudo bem adiar, tudo bem repensar, tudo bem esperar...
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